No Brasil, metade dos professores não recomendaria a um
jovem se tornar educador, por considerar a profissão desvalorizada, revela a
pesquisa Profissão Docente, iniciativa da organização
Todos Pela Educação e do Itaú Social.
De acordo com o levantamento feito pelo Ibope Inteligência
em parceria com a rede Conhecimento Social, a maioria (78%) dos professores
disse que escolheu a carreira principalmente por aspectos ligados à
afinidade com a profissão. Entretanto, 33% dizem estar totalmente
insatisfeitos com a atividade docente e apenas 21% estão totalmente satisfeitos.
Durante a pesquisa, foram entrevistados 2.160 profissionais
da educação básica em redes públicas municipais e estaduais e da rede privada
de todo o país, sobre temas como formação, trabalho e valorização da carreira.
A amostra respeitou a proporção de docentes em cada rede, etapa de ensino e
região do país, segundo dados do Censo Escolar da Educação Básica
(MEC/Inep).
Para o diretor de políticas educacionais da organização
Todos pela Educação Olavo Nogueira Filho, os dados são preocupantes. Ele reforçou
a necessidade de repensar a valorização da carreira dos professores
brasileiros. “Há bastante tempo conhecemos o desafio da desvalorização docente,
da falta de prestígio em relação à carreira, mas acho que os novos dados chegam
para reforçar e, mais uma vez, mostrar que temos um longo caminho a ser
trilhado na educação, no que diz respeito à valorização da carreira”, afirmou.
Formação
Os docentes apontam como medidas mais importantes para a
valorização da carreira, a formação continuada (69%) e a escuta dos docentes
para a formulação de políticas educacionais (67%). Eles consideram urgente a
restauração da autoridade e o respeito à figura do professor (64%) e o aumento
salarial (62%).
Para o diretor Nogueira Filho, os números passam relevante
mensagem no sentido de desmistificar o senso comum, que coloca a questão
salarial como o principal problema para a carreira docente no país.
“O debate, de modo geral, tem colocado ênfase, de maneira
quase isolada, na questão salarial. E, de fato, esse ponto surge no conjunto
das principais medidas que as pessoas entendem como importantes para valorizar
a carreira, mas não aparece na pesquisa como fator principal. Acho que isso
traz uma questão importante sobre a discussão da valorização], que precisa ir
além da questão do salário.”
A remuneração média dos professores no Brasil atualmente,
segundo a pesquisa, é de R$ 4.451,56. A maioria dos docentes (71%) tem a
profissão como principal renda da casa e 29% afirmam ter outra
atividade como fonte de renda complementar.
Segundo a pesquisa, um em cada três professores tem contrato
com carga horária de menos de 20 horas semanais, o que
pode ter impacto na renda e no cumprimento de um terço da carga
horária, prevista na Lei do Piso do Magistério para atividades extraclasse.
Pelo menos 58% dos professores afirmam ter tempo remunerado fora da
sala de aula. Contudo, somente cerca de 30% dos docentes dispõem de
aproximadamente ou mais de um terço da carga horária para planejamento de aula.
Políticas públicas
Os professores ouvidos pela pesquisa consideram que é
papel das secretarias de Educação oferecer oportunidades de formação
continuada (76%), mas não concordam que programas educacionais, como um todo,
estejam bem alinhados à realidade da escola (66%). Apontam a falta um "bom
canal de comunicação" entre a gestão e os docentes (64%), e dizem que não
há envolvimento dos professores nas decisões relacionadas às políticas públicas
(72%). Também consideram aspectos ligados à carreira mal atendidos, como o
apoio à questões de saúde e psicológicas (84%) e ao salário (73%).
Falta de confiança
Para o diretor de políticas educacionais da organização
Todos pela Educação Nogueira Filho, os dados mostram que a falta de confiança
entre o professor e as secretarias estaduais e municipais de educação é outro
desafio a ser enfrentado. “Uma parcela significativa dos professores diz não
acreditar que a secretaria tem lançado mão de políticas que tenham aderência à
sua escola e, mais do que isso, mostram descrença com relação ao próprio
compromisso da secretaria para com a aprendizagem dos alunos”.
O governo federal anunciou, em fevereiro deste ano, o aporte de R$ 1 bilhão para a Política Nacional de
Formação de Professores, com objetivo de financiar 190 mil vagas em três
diferentes iniciativas para formação docente: o Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), o Programa de Residência Pedagógica e a
Universidade Aberta do Brasil (UAB).
“São políticas que apontam no sentido correto e desejável,
mas, considerando o tamanho do desafio, é razoável dizer que são insuficientes
para, de fato, reverter o cenário que a pesquisa traz no que diz respeito à
valorização da profissão, das estruturas da carreira e a qualidade da formação,
tanto do ponto de vista inicial quanto continuado”, disse.
O diretor ressaltou a necessidade de mudança
estrutural na formação inicial dos docentes. Na sua opinião, o governo
federal pode ter papel importante na indução de melhorias a partir da
criação de parâmetros de estruturação de carreira que possam ser seguidos pelas
secretarias de educação.
Procurados pela reportagem, o Ministério da Educação e o
Conselho Nacional de Secretários da Educação (Consed) não se manifestaram até o
momento de publicação da matéria.