A união de interesses pela Medicina e pela Matemática e
Engenharia tem conduzido o médico patologista Jorge Sergio Reis Filho (CRM-PR
17.437) a uma trajetória de muitas conquistas na pesquisa contra o câncer.
Natural de Paranavaí, Dr. Jorge é, atualmente, chefe do Serviço de Patologia
Experimental do Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York, onde
lidera um grupo de pesquisas em alterações genéticas causadoras de tumores
raros e na análise da heterogeneidade genética em tumores.
Filho do médico Jorge Sergio Reis (CRM-PR 3.076) e da
bioquímica Carmem Dal-Prá Reis, ele já passou por três países e dois
continentes desde que finalizou a residência médica em Patologia pelo Hospital
das Clínicas da UFPR, em Curitiba, no ano de 2001.
Sua luta especial no tratamento de câncer começou a partir
de experiências ainda no âmbito familiar, já que os avôs maternos foram
acometidos pela doença. Em 1997, um ano antes de concluir a graduação em
Medicina, já dedicava especial atenção ao avô, ex-prefeito de sua cidade natal
e também deputado constituinte, que lutaria por 17 anos contra um câncer. A avó
mereceu os cuidados por oito anos, por causa de câncer de mama.
Medicina e
Engenharia: duas paixões
“Minhas duas paixões eram a Engenharia e a Medicina”, lembra
o pesquisador do momento em que precisou optar por uma das carreiras na época
do vestibular. Na dúvida, prestou as provas para os dois cursos, mas acabou
passando em Medicina pela UFPR. Ainda assim, tentou durante um ano e meio
conciliar o curso de Medicina com o de Química Industrial pela PUCPR.
A indecisão sobre qual área seguir terminou ao conhecer a
Patologia. “Foi quando descobri que poderia fazer as duas coisas de que mais
gostava juntas”, recorda. A partir de então, seu foco ficou completamente
voltado para a pesquisa nesse segmento.
No quinto ano de faculdade, conseguiu sua primeira
oportunidade fora do País. “Queria fazer coisas relacionadas a genética e
patologia e apareceu essa oportunidade em um novo centro de patologia molecular,
em Portugal”, ele lembra.
Na volta ao Brasil, terminou a faculdade de Medicina e, na
sequência, iniciou residência em Patologia no Hospital de Clínicas, em
Curitiba. Assim que finalizou a especialidade, retornou a Portugal para um
programa de estudos de um ano e meio (fellowship)
e, logo depois, conquistou uma bolsa de estudos para financiar seu doutorado,
dessa vez, na Inglaterra.
Período na Inglaterra
“Foi quando minha carreira, de fato, se transformou”,
acredita. Ao longo dos 11 anos em que viveu naquele país, Dr. Jorge passou de
estudante de doutorado do Institute of
Cancer Research, em Londres, a líder do time de patologia molecular e,
depois, em 2010, a professor catedrático. Ainda no ano de 2010, recebeu dois
prêmios que projetaram sua figura no meio acadêmico: o Ramzi S. Contran
Cientista Jovem da Academia de Patologia dos Estados Unidos e Canadá (United States and Canadian Academy of
Pathology) e o Líderes do Futuro, do Cancer
Research UK. “Claro que esses prêmios ajudaram a projetar minha carreira,
mas a grande verdade é que foram o resultado de muito suor, lágrimas e horas de
laboratório combinados à contribuição de pessoas brilhantes as quais tive o
privilégio de liderar”, pondera.
Ao longo desse caminho, o médico pesquisador acredita que
sua formação em Medicina pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), há exatos
20 anos, garantiu-lhe uma base teórica robusta e uma forma de atuar diferente
dos colegas de outras nacionalidades. “A forma como aprendi Medicina no Brasil
é muito diferente da forma que se ensina na Inglaterra, em particular na área
da Patologia”, explica.
Mudança para os EUA
Dr. Jorge lidera grupo de pesquisas no Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York (Foto: Divulgação MSKCC)
Desde 2012, Dr. Jorge aceitou o desafio de chefiar a
Patologia experimental do Memorial Sloan
Kettering Cancer Center. Atualmente, lidera uma equipe de pesquisadores de
várias partes do mundo. “Meu trabalho é focado em entender qual a base genética
de tipos especiais de câncer”, ele explica de forma didática.
Seu time desenvolveu vários métodos para identificar as
alterações genéticas que levam ao desenvolvimento de células doentes. Com a
identificação da base genética desses tumores raros, é possível chegar a formas
de tratamento para os pacientes, assim como descobrir e identificar uma nova
categoria de genes que estão relacionados ao câncer.
Outra linha desenvolvida em seu laboratório é a
heterogeneidade genética dentro do próprio tumor. Para seu estudo, desenvolveu
uma tecnologia específica, o sequenciamento de células individuais, que pode
ser aplicada a material histológico de rotina, e vem desenvolvendo novos
métodos para a chamada biópsia líquida, exame que identifica sinais da doença
por meio de amostras de tecido biológico não sólido, especialmente o sangue.
Família e distância
do Brasil
Dr. Jorge é casado com a bioquímica alemã Britta Weigelt e juntos têm o pequeno Luca, de quatro anos (Foto: Arquivo pessoal)
Desde que saiu permanentemente do país, em 2001, Dr. Jorge
tenta manter seus laços por meio do contato com a família e do trabalho. Além
disso, ele explica que possui projetos no Brasil, estando envolvido em um grupo
de trabalho em São Paulo para o desenvolvimento de pesquisa genômica de
precisão.
Mas a distância é muito grande, admite. “Tento fazer minha
parte em contribuir com o Brasil trazendo estudantes brasileiros para o meu
laboratório, participando de projetos e fazendo palestras”, exemplifica. A
influência brasileira também aparece na educação do filho de quatro anos, Luca
Ernst Reis-Weigelt, que já fala muitas coisas em português: “Eu só falo português
com ele”.
Casado com a bioquímica alemã Britta Weigelt, diretora do
laboratório de pesquisa em tumores ginecológicos do mesmo centro em que
trabalha, Dr. Jorge divide com a esposa e os demais pesquisadores da
instituição o desejo de prosperar na busca por formas de se curar o câncer.
Na última década, as suas visitas à família na cidade natal
têm sido discretas. Um pouco pela projeção internacional de seu nome, com os
prêmios recebidos e ainda a nomeação, em 2014, como “uma das mentes científicas
mais influentes do mundo pela Thomson Reuters” e o título, no ano seguinte, de
integrar o seleto grupo dos 100 pesquisadores mais importantes do mundo.
A mãe, Carmen Dal-Prá Reis, relata com orgulho a trajetória
do Dr. Jorge Filho, em especial por sua visão humanista, por sua dedicação e
amor ao próximo. Recorda que seu pai, Dionísio Assis Dal-Prá, um dos pioneiros
de Paranavaí, contou sempre com especial carinho do neto ao longo de sua
enfermidade. “Poucos meses antes da perda do meu pai, falecido em maio de 2014,
ele fez uma visita e passou uma semana com o avô, até dormindo ao lado dele e
de mãos dadas. Muito carinhoso e até hoje usa as mesmas frases do avô”, conta
Carmen, reforçando a dedicação também dispensada à avó no período de em que
esteve em tratamento.
Sobre o longo período de convivência com doença na família,
a mãe do cientista reconhece que “foi uma vida de sacrifício, mas que tudo está
bem resolvido em nossas mentes”. E realça: “Meu filho diz que veio para essa
vida para ser um sacerdote da ciência e não para juntar bens. Atende muitos
casos, pessoas que me contatam aqui no Brasil; não admite sequer que perguntem
quanto é. Ele é uma alma generosa. Para nós, motivo de muita alegria.”
O Dr. Jorge tem um irmão, Guilherme, que a seu exemplo e dos
pais, também se formou pela Universidade Federal do Paraná. Guilherme cursou
Direito e integrou a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, estando atualmente
na França. O pai, que se formou em 1971, integra a Unimed Paranavaí.
Novos desafios e
projetos
Referência ao médico brasileiro em publicação internacional. (Foto: Reprodução)
Ao longo de seu caminho fora do Brasil, Dr. Jorge acredita
que o maior desafio que enfrentou foi aceitar e se adaptar às novas culturas.
“Tive de aprender a identificar quais elementos de minha formação, enquanto
brasileiro, eram úteis em uma cultura diversa, para então, usar as coisas boas
que trazemos e combiná-las com os novos elementos; mas isso não vem
naturalmente”, explica.
Para o futuro, ele deseja que o câncer passe a ser
considerado uma doença curável ou, “na pior das hipóteses”, uma doença crônica.
“Meu maior desejo é poder ver a Medicina para pacientes com câncer guiada mais
por princípios biológicos do que por empirismo”, afirma, sonhando ainda mais
alto: “Nosso intelecto é uma coisa tão bonita e há tanto por se atingir ainda,
que acredito que chegaremos num momento em que as pessoas não precisarão mais
ter medo dessa doença”.